Eu tenho, ao escrever esse texto, trinta anos, a poucos dias de completar trinta e um. Estou casada há quase sete anos, e já tem um tempinho que começaram as cobranças por um filho, um "fruto" da nossa união.
Durante toda a minha vida antes do Edson, eu nunca me imaginei como mãe, no sentido de ter alguém criado e saído de meu ventre. Mas, em várias oportunidades vislumbrei a possibilidade de ser mãe adotiva, e coisas do tipo.
No iniciozinho do nosso relacionamento eu assisti um filme chamado "O Lutador", e lembro de ter uma vontade forte de ter um filho biológico. A verdade é que acho que não entendi o filme direito na época, e estava muito sensibilizada ainda com a morte de minha mãe. Depois disso, o mesmo desejo em momentos de desespero em meio a crises depressivas muito fortes, e por fim, como resultado de pressão dos meus sogros que, naturalmente desejam netos.
Mas hoje, eu não sinto desejo, necessidade ou mesmo vontade de gerar um filho. Adotar volta e meia é um pensamento recorrente, e aqui vai o porquê: sei que muitas crianças orfãs precisam de alguém que as ame, e que cuide de verdade delas. Não tenho necessidade de laços sanguíneos para amar. Mas há um porém, uma criança que já foi rejeitada, as vezes a partir do seu nascimento (ou concebimento), precisa de alguém forte, e que saiba lidar com suas necessidades e peculiaridades. E eu, por minha vez, ainda não me sinto segura de dizer que sou essa pessoa.
Ter um filho, ou adotar uma criança, que seja, significa ser responsável por uma vida. Ser responsável pelo que será daquele ser, daquele momento por toda a sua vida. É permanente, e é a coisa que mais necessita de sua atenção e total responsabilidade. Tendo dito isso, sim é assim mesmo que vejo. E por isso mesmo, eu acredito que fazer um filho, ou mesmo criá-lo, não te faz um bom pai/mãe. Há muito mais envolvido no processo. E muita gente nunca deveria ter filho. Por enquanto, uma dessas pessoas sou eu.
Estou ciente que não existe uma paternidade/maternidade perfeita. Mas um pai ou mãe tem que prover o essencial para a formação de seu filho. E eu não estou falando apenas da parte material, isso é importante. Mas tem um papel, ao meu ver, até secundário. Uma criança precisa de estabilidade e segurança emocional, um lar sem conflitos, oportunidades para crescer e ser ela mesma, uma certa liberdade e senso de responsabilidade, inclusive por si mesma, e claro, carinho, atenção e amor. E isso alguém que ainda está tentando se encontrar, que não está resolvido, que não está preparado emocional e financeiramente, não pode prover.
Na infância é que formamos nosso caráter, é que definimos, muitas vezes, como seremos por toda nossa vida. E não é justo que a gente ponha filho no mundo porque ache que é nossa obrigação - nós não estamos vivendo um período de baixa no número de humanos, pelo contrário! Eu entendo que há pessoas que sonham em ser pai/mãe, que assim o seja, mas primeiro que organize sua vida, saiba que está pronto pra esse comprometimento irrevogável. Entenda a sua responsabilidade como progenitor/progenitora. Não tenha filho porque acha que deve, você não tem obrigação com sua espécie; porque seus pais/sogros ou apenas seu companheiro/companheira deseja; pra segurar alguém ao seu lado num relacionamento - isso não funciona, e ainda tem o potencial de te fazer sozinho e com um filho pra criar, que por vezes, não terá muito contato com o pai ou mãe, ou os dois, já que se trata de um objeto de barganha e frustração; ou ainda, porque você quer um mini-me seu ou de seu parceiro ou parceira: uma criança é outro ser, e por mais que você se esforce pra educá-lo à sua maneira, ele vai ter os próprios princípios - é assim que o mundo avança, por sinal. Pense em quando estava crescendo, e em como você mesmo é diferente de seus pais.
Em oportunidades anteriores, conversando com conhecidos e amigos, a gente sempre passa por momentos "curiosos" falando sobre o assunto. Tem a parte de ter um filho ser uma coisa sagrada na vida de um casal, o que não nos toca, já que ambos não somos religiosos. Uns olhares tortos, e uma frases do tipo: Ah, vocês ainda vão mudar esse pensamento depois. E a gente fica sem ter argumentos. É claro que a gente pode mudar de ideia depois quanto a querer, o fato é que depois de ter um filho, é que você não pode voltar atrás. Esse é nosso pensamento atual, é óbvio, e como tudo no universo, pode não ser definitivo. A situação que consideramos mais engraçada é quando o casal (ou indivíduo) está reclamando da vida de pai/mãe, do trabalho que dá, de como sua vida nunca mais será tranquila, da responsabilidade, falta de liberdade, daí quando a gente diz que não quer ter filho, o discurso vira outro e aí a pessoa diz que a gente precisa ter filho, porque é bom também, é a alegria da pessoa, é alguém pra cuidar de você quando velho. Que ao nosso ver, é o motivo mais desonesto para se ter um filho. Se você pensa assim, invista algum dinheiro a longo prazo ou faça uma poupança. Dá menos gasto, não irá te decepcionar e é certo de que vai lhe servir em sua velhice (quem sabe você possa pagar uma casa de repouso). Nem todo mundo tem cabeça pra cuidar dos pais quando esses envelhecem, eu sei que é triste, mas é fato. Não é garantia que seu filho ou filha vá querer isso. E não é justo pra ele ou ela, que em sua vida adulta tenha que desistir de sonhos e oportunidades pra cuidar dos pais. É drama demais!
Por fim, isso aqui são devaneios incompletos sobre o que significa pra mim ser mãe ou pai. O que representa ser o cuidador/cuidadora de uma criança. E como você não precisa ser pai ou mãe pra ter uma vida completa.
Tenha filhos, mas apenas se perceber o peso disso, e mesmo assim esteja disposto a arcar com todos os contras. Como tudo nessa vida, é uma decisão que deve ser muito bem pensada. E por enquanto, eu estou do lado dos que não desejam ser pais. Eu ainda quero aproveitar a vida de casal ao lado do Edson, e ser a cuidadora de muitos seres, mas todos bem mais simples que um ser humano.
P.S.: O título desse texto vem de uma música dos Titãs, composta por Arnaldo Antunes, Sérgio Britto e Marcelo Frommer chamada "Comida". E sua letra ilustra bem o que falo sobre o material ser o básico, mas que outros aspectos entram no que é essencial em nossa formação.
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